É difícil conceituar a empresa familiar?
- Armando Lourenzo
- 16 de abr. de 2018
- 3 min de leitura
Tenho tentado, há muito tempo, conceituar a empresa familiar, mas a dificuldade é muito grande. Normalmente os conceitos existentes tangenciam a família, a sociedade ou mesmo a gestão e desta forma tornam os conceitos existentes úteis para enquadramos as empresas familiares em uma categoria. Porém esquecem que o lado comportamental é seguramente a parte mãos evidente do que são as empresas familiares.
Concordo que boa parte dos conceitos tem um fundamento muito sólido em termos de explicações, mas prefiro entender a empresa familiar a partir de várias perspectivas. Para tal pesquisei quais são as suas principais características com o propósito de expandir os conceitos tradicionais.
Pelas minhas pesquisas e experiência profissional as características a seguir procuram explicar a verdadeira realidade das empresas familiares:
Decisões emocionais: a lógica das empresas tradicionais é a de tomarem as decisões com base em critérios racionais, porém nas familiares o componente emocional é muito aparente. Fato este que não pode ser entendido como algo frequentemente negativo, pois a intuição de empreendedores ou os valores de uma família podem ser decisivos para o sucesso da empresa.
Transferência de crises: esta característica mostra que é possível haver problemas na empresa que são provenientes de crises familiares e vice-versa. Neste sentido a separação da gestão da empresa dos comportamentos familiares tem de existir dentro dos limites de sucesso da família e da empresa.
Dificuldades na descentralização: é muito comum identificarmos fundadores centralizadores, mas precisamos entender o contexto antes de criticarmos. Os fundadores quando iniciam suas empresas muitas vezes não tem com quem compartilhar suas principais decisões em razão de em alguns momentos não terem pessoas qualificadas para tal situação. Passam anos decidindo sozinhos e a cada ano de sucesso tem um reforço para a centralização. A descentralização começará somente quando os fundadores sentirem segurança em compartilharem as suas decisões e perceberem que chegou a hora de iniciarem a sucessão.
Lealdade e dedicação como critérios de Recursos Humanos: é nítido que em algumas empresas o critério de competência fica em segundo lugar quando comparado aos critérios de confiança e apoio passado pelos funcionários ao fundador (segunda família). Este fato faz com que critérios como manutenção, promoção e remuneração de colaboradores possam ser reflexos de relacionamentos e não de critérios profissionais. Tem diminuído muito este quadro em razão da profissionalização das empresas, mas ainda é possível vê-lo com alguma frequência.
Confiança mútua: esta é a característica mais frequente nas empresas familiares e que tanto pode ser o fator de sucesso para o futuro da empresa como o motivo do fracasso destas empresas.
Dificuldade em separar a família da empresa: muitos empreendedores de empresas familiares não aceitam que misturam a empresa com a família. Então qual o motivo de escolherem, dentro do grupo dos herdeiros, o gestor sucessor e não um profissional qualificado? Por que os conflitos da família podem interferirem nos relacionamentos societários? Pensem nisto.
Existência de conflitos: o número é alto, mas os conflitos aparecem em 85% das empresas familiares e podem ser decisivos no sucesso da fase de sucessão da sociedade ou da gestão.
Perfil do sucedido = Perfil do sucessor: é muito comum os fundadores escolherem para o cargo de dirigente o herdeiro mais parecido com o sucedido em termos de gestão. Pode ser um grande erro, pois o estilo de gestão do fundador pode ter sido muito adequado até aquele momento da empresa, mas no futuro talvez seja necessário um outro estilo de liderança.
Poderia escrever sobre várias características de empresas familiares e sempre tomando o cuidado de não expressar a minha opinião de certo ou errado.
Mas meu maior objetivo sempre será o de demonstrar que as empresas familiares podem ser entendidas por diversas perspectivas e não somente por um conceito específico.
Armando Lourenzo é Doutor em Administração e Mestre em Recursos Humanos pela FEA/USP. Professor, Escritor e Palestrante.
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